Na festa de Pentecostes, esbarramos no maior mistério de toda a história humana e possível. A nossa cabeça é muito pequena para entender o significado desta festa. Nossa inteligência é muito boa, fantástica para lidar com as coisas. Com grande ênfase, os jornais noticiaram que os americanos conseguiram fazer uma célula viva em laboratório.
Ficaram radiantes de alegria, mas o que é isso se comparado a nosso Deus criador de bilhões e bilhões de células vivas? É um mistério imenso, gigantesco de um Deus, que é Pai, que é Filho e que também é Espírito Santo. A nossa inteligência não consegue chegar, com a simples razão não conseguimos atinar. Por isso, usamos símbolos, comparações. Para as realidades muito profundas, as palavras coisas não servem e precisamos buscar símbolos. Quando nos deparamos com o mistério, não conseguimos entendê-lo. Precisamos procurar imagens que, olhadas na sua visibilidade, nos abram horizontes maiores.
Um dos maiores mistérios que nos confronta é a liberdade humana. Os psicólogos vivem debruçados sobre as pessoas, mas não conseguem entender, muito menos interpretar a sua liberdade. De tal maneira ela é misteriosa e incompreensível, que se chegou a pensar que fosse um feixe de condicionamentos. A liberdade humana é espantosa. Entramos por um caminho e, de repente, resolvemos ir por outro sem sabermos a razão.
A inteligência não pode entendê-la porque ela não é coisa, mas uma realidade que brota do nosso interior. A mesma coisa acontece com o amor. Esbarramos nele, aproximamo-nos dele e não entendemos. Pensamos que amamos e muitos anos depois vamos perceber que não era amor. Isso também acontece em relação à Trindade. Pobre inteligência humana! E quando nos deparamos com o mistério, não conseguimos entendê-lo. Precisamos procurar imagens que, olhadas na sua visibilidade, nos abram horizontes maiores. Não temos conceitos, ideias, então usamos símbolos, que são muito bonitos. Para Deus-Pai e o Filho, temos uma enorme quantidade, mas hoje não é a festa deles.
Para o Espírito Santo, temos uma quantidade enorme de títulos: intercessor, consolador, que nos ajudam a chegar mais perto, mas podemos começar pelo sinal da cruz. O Pai e o Filho fazem o traço vertical, enquanto o Espírito Santo sozinho faz o horizontal. O Pai e o Filho fazem descer, obviamente, de cima para baixo, e o Espírito Santo vai de leste para oeste. Isso para dizer que é amplo, que abarca toda a humanidade.
Quando o sol nasce no leste e se põe no oeste, ele cobriu todo o nosso hemisfério, e depois cobrirá também o outro hemisfério. Todos os dois hemisférios são totalmente iluminados por um só movimento de leste para oeste, que é o movimento do Espírito. Ele nos é dado para que o nosso coração não fique pequeno, para que não fiquemos fechados, para que os nossos olhos se abram para os seis bilhões de pessoas que habitam esta Terra. Quando fizerem o sinal da cruz, abram bem os corações para o Espírito Santo, de ombro a ombro, de leste a oeste, e lembrem-se de que Ele é dado para todos.
A liturgia nos coloca uma enorme quantidade de títulos para o Espírito Santo, mas como o nosso tempo é curto, ficarei apenas com alguns. Um dos mais usados é paráclito, que vem do grego, a língua dos cristãos da diáspora, isto é, os que moravam fora de Jerusalém, até mesmo em Roma, onde o povão também falava grego. Era uma língua muito forte para os cristãos. E eles chamaram o Espírito Santo depara-kletos. Para significa ao lado, junto, perto, ligado; kaleo significa chamado.
O Espírito Santo é aquele que é chamado para estar bem pertinho de nós. É como se o Pai nos dissesse que, quando estivéssemos com problemas, não precisaríamos chamar por Ele, que estaria mais distante; nem pelo Filho, que já subira aos céus. É pelo Espírito Santo que deveremos chamar, pois Ele sempre estará ao nosso lado.
Se quisermos falar com Jesus, precisaremos primeiro chamar o Espírito Santo, pois é Ele quem nos recordará o que nos falou o Filho. É Ele que nos dará inteligência, compreensão, afeto, amor, paixão. Sem o Espírito Santo, somos um galho seco, somos uma pedra gelada. Se não nos comunicamos, a solidão nos engole, podendo até nos levar ao suicídio. O suicida não é um criminoso, mas alguém tão sufocado pela solidão que busca na morte a presença que lhe falta.
O Espírito Santo nos aquece, daí a imagem das línguas de fogo. Nós, depois da luz elétrica, do fogão a gás, não podemos entender a beleza e a importância do fogo. Precisamos imaginar aqueles recantos de nossa infância, e mesmo em muitos lugares no interior desse nosso Brasil, aonde ainda não chegou a eletricidade, aonde a escuridão é mais escura mesmo. Aí só o fogo pode iluminar e aquecer. Portanto, o Espírito Santo é aconchegante, reúne e agrega, como a fogueira que, nas noites frias, junta as pessoas à sua volta. Perto do Espírito Santo faz calor. O amor aquece, e o Espírito Sto é amor.
Outra imagem nos mostra o Espírito Santo como hóspede – “doce hóspede de nossa alma”. Nós estamos perdendo muito a beleza da hospitalidade. Antigamente, as casas eram maiores, a vida era mais simples. Vinham pessoas do interior visitar os parentes e eram acolhidos com festa. Cada um que chegava era uma alegria. O Espírito Santo é o grande hóspede quando o nosso coração está triste, sozinho.
Ele vem falar-nos palavras suaves. Quando experimentamos a alegria de acolher e ser acolhido, saboreamos uma nesgazinha do Espírito Santo. Como as visitas que, geralmente, trazem um presentinho, o Espírito Santo traz presentes muito maiores, são sete os dons que Ele nos traz generosamente, sem nenhuma economia ou limite. Para Deus, o único limite é a pequenez de nosso coração e não a grandeza do seu amor. Nós somos como o recipiente que acolhe os dons de Deus. Se a nossa vasilha é grande, acolhemos muita água, mas se é pequena, pegamos apenas algumas gotas. A chuva é a mesma, que pode provocar uma inundação e encher os oceanos ou encher uma simples caneca. Depende só de nós abrirmo-nos a esse Espírito.
Há também a imagem da luz, que é muito bonita. Quando há um black-out, ficamos assustados, a escuridão nos apavora. Quando uma luz se acende, é como se a vida voltasse. Sem o Espírito Santo, nós tropeçamos na escuridão de nós mesmos, na nossa própria pequenez. Mas Ele só aquece e ilumina, só é hóspede dentro de nós quando houver quietude, serenidade. Ele não pode atuar em meio ao barulho e agitação.
Seria tão bonito se nunca fôssemos dormir sem parar alguns minutos para ouvirmos o Espírito. Garanto que seríamos mais sadios psíquica e espiritualmente. Nossa alma, nossa afetividade necessita de repouso, que só encontramos no Espírito. Recolhamo-nos alguns momentos diante dessa face interior de Deus e nos disponhamos a ouvi-lo. Só aí encontraremos ânimo, força, coragem, alegria para irradiarmos também paz e serenidade aos nossos irmãos. Amém.
Pe. João Batista Libanio