A morte de Jesus e os crucificados da história
Jesus de Nazaré não procurou a morte, ela vem como consequência da prática do anúncio do Reino e da denúncia da injustiça estrutural e violenta na sociedade. Jesus de Nazaré estava marcado para morrer porque incomodava as autoridades da época (Jo 11, 49-53).
Os Evangelhos nos narram várias tentativas e ameaças para eliminar Jesus (Mc 3,6; 11,18; Lc 4,28-30; Jo 5,18.59; 10,31), para matá-lo (Mc 14,1-2; Jo 11,45-52). Inclusive o próprio Jesus sabia que era um marcado para morrer, como consequência de sua prática com a causa do Reino (Mc 8,31; 9,31; 10,32-34). Jesus foi ameaçado de morte, logo perseguido e finalmente eliminado, por ser considerado uma "ameaça" aos privilégios do sistema religioso e político. Foi perseguido e rejeitado por suas ações, gestos e palavras. A morte de Jesus é consequência da sua prática em favor da justiça, por sua fidelidade a causa do Reino de Deus.
Na semana Santa nós cristãos, fazemos uma releitura do servo sofredor do profeta Isaias, à luz da morte de Jesus, mas também é bom lembrar que o profeta está falando do povo de Israel, que está no exilio na Babilônia e sofre as consequências de um sistema injusto. Não podemos não relacionar a morte de Jesus com a morte de tantos crucificados na história, de maneira especial este ano as mortes causadas pela guerra na Ucrânia. Paixão de Cristo, paixão do povo!
A interpretação do servo sofredor como povo ou comunidade que sofre o exílio babilônico mostra que Israel se oferece como sacrifício de expiação pelos pecados das nações. “Tu és meu servo, és Israel” (Is 41,8-9; 49,3). Porém, o servo sofredor não se refere apenas ao povo de Israel é também um personagem escatológico-messiânico, neste sentido pode ser aplicado a Jesus; ainda seria o próprio profeta Isaias. (Is 43, 10; 44,26; 50,10; 59,21).
Tanto o servo sofredor como Jesus são semelhantes, são homens de dores, habituados ao sofrimento (Is 53,3), comprometidos para estabelecer a justiça e o direito (Is 42,4-7). A prática pela justiça ocasiona perseguições e morte, são martirizados como o servo desfigurado, não sendo mais considerados como gente, causando espanto, asco e horror (Is 52,14; 53,2). O Servo sofredor é "desprezável e os homens, não fazem caso dele" (Is 53,3), tirando-lhe tudo, até a própria dignidade. O servo sofreu pacientemente, foi humilhado, desfigurado e foi vítima das estruturas injustas da sociedade, onde se vive e se morre esmagado (Is 53, 4-12).
A repressão do servo sofredor contra a luta pela justiça foi brutal (Is 53,8-9), primeiro tentando desacreditá-lo, dizendo que é "subversivo" e "perigoso", logo sendo assassinado e sua morte não foi investigada (Is 53,9). O servo sofredor foi morto por estabelecer o direito e a justiça (Is 42,1.4). Ele foi escolhido por Deus para ser a salvação do mundo (Is 49, 3-7); Carregou o pecado alheio (Is 53,5-9), o pecado de muitos (Is 53,12).
Hoje o servo sofredor é o povo massacrado pela guerra e pela injustiça, os que morrem lenta, constante e continuamente no dia-a-dia, sem terem nenhuma defesa, como o servo de Sofredor. São simplesmente mortos e massacrados pelo sistema. São o povo Crucificado, as maiorias oprimidas durante a vida e massacradas durante a morte, são vítimas de um sistema violento de morte, são as que melhor expressam o sofrimento do mundo. Elas completam na sua carne o que falta à paixão de Cristo. São hoje o servo sofredor e o Cristo crucificado.
Rafael Lopez Villasenor, sx