As Cinzas, símbolo de nossa pobreza!
Com a quarta feria de Cinzas começamos a Quaresma, tempo de Conversão. A conversão acontece através da oração, da penitência e o jejum faz parte, da caridade e no Brasil acontece de maneira especial pela Campanha da Fraternidade.
Converter-se significa voltar-se para Deus. Não há conversão sem oração. Não há oração sem confiança em Deus. A oração baseada na confiança nos faz, súbito, ver nossa pobreza de méritos e a necessidade de Alguém que nos dê a mão e a serena convicção de que, ajudados, mão na mão do Senhor, podemos chegar a Páscoa. Símbolo da nossa pobreza, ou até mesmo nulidade, é a cinza que recebemos hoje sobre nossa cabeça. Ela nos recorda de imediato a origem e o destino de nosso corpo, ou seja, a fragilidade da nossa existência na terra.
Mas ela nos pode lembrar também o pó da estrada que encontram os caminhantes. Os caminhantes somos nós e nossa meta é chegar com Jesus à Paixão e à Ressurreição. É a Ressurreição de Jesus que nos diz que, embora nosso corpo seja destinado ao pó, nossa pessoa tem um destino eterno. Cada um de nós poderá dizer com os Apóstolos que nossa única missão é sermos “testemunhas da Ressurreição de Cristo” (At 4,33) na terra e “participantes da natureza divina” (2 Pd 1,4) no céu. São Francisco costuma dizer que a “cinza é casta e pura”.
O fogo, que purifica os metais, purifica também as cinzas. Assim quando o homem queima o fogo da penitência seus apetites mundanos e seus ídolos, o que sobra são as cinzas castas, um coração puro, inteiramente pronto para, da morte, passar à vida eterna. São Francisco não esperou que seus confrades se sentassem sobre cinza. Francisco havia entendido a caducidade das coisas terrenas, havia queimado suas paixões desordenadas e penitenciando seu corpo.
Pode vir-nos o pensamento que conversão é uma questão de nossa vontade. Sem e não. Sim, porque exige nosso querer, nosso esforço, nossa perseverança. Não, porque a conversão é graça dada por Deus, que deve ser pedida. Deus é a razão última e o primeiro motor de nossa conversão. Na verdade, a conversão pe mais um ato de acolhimento daquilo que o Senhor nos diz e pede de nós. O voltar-se para Deus implica uma mudança no modo de pensar e de agir. Ou seja, um conformar nosso pensamento e ação à proposta que Deus tem para nós.
E qual seria a proposta que Deus tem para nós? Ela vem explicitada com bastante clareza no ensinamento e na pessoa de Jesus. Poder-se-ia dizer que converter-nos implica descentrar-nos de nós mesmos e centralizar nossa vida e nossas metas em Jesus. Sou um satélite do Senhor, de quem recebo luz, movimento e sobrevivência. Meu ideal é poder com toda a sinceridade e veracidade do coração: “Não sou mais eu que vivo, é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20)
Talvez seja bom lembrar que a conversão não me pede tanto que eu discuta o meu comportamento, quanto eu me deixe interpelar pelo comportamento de Deus e meu respeito. Por exemplo: Deus é tico em misericórdia comigo. Desse fato nasce a pergunta: que tanto tem a minha misericórdia para com os outros? Deus me ama com imenso amor e gratuitamente. Desse fato nasce a pergunta: por que meu amor para com o próximo é tão interesseiro e raras vezes é gratuito? Deus deu sua vida por mim, sem que eu merecesse. Disso nasce a pergunta: Até que ponta a minha vida pertence aos outros? Deus entrou na minha história e assumiu a minha condição humana. Por que eu resisto tanto a entra na história de Deus e chego a anular as sementes divinas que existem em mim?
Já nessas lembranças estão presentes os grandes temas da Quaresma: oração e jejum, saudades do céu, fidelidade à aliança com Deus, preparação para uma missão, purificação dos pecados e a consequente penitência.